Crime chegou em bairros tradicionais de são paulo e mudou rotinas
A criminalidade avançou nos bairros; assaltos nas ruas e invasões a residências se tornaram frequentes. Diariamente, relatos pelo whatsapp, redes sociais e nos comércios das vinhanças, repercutem o medo generalizado dos moradores dos outrora bairros tranquilos da Pauliceia. O clima de terror, sem exageros, de terror, se faz presente nas regiões antigas e centrais de São Paulo, consideradas relativamente seguras antes da pandemia. Mas agora o quadro é outro, e preocupante de tal monta, que tem mudado a rotina de paulistanos na busca por menor risco de serem vitimados.
A consequência é evidente e triste: hábitos antigos e saudáveis estão mudando rapidamente, piorando a qualidade de vida em nossa cidade.
A descaracterização desses bairros, muitos dos quais lembram cidades tranquilas de nosso interior, por seu ritmo mais ameno, onde as pessoas se conhecem e se cumprimentam no dia a dia, onde, ainda, crianças andam ou andavam pelas ruas, tem levado seus moradores à estratégia preventiva de ficar cada vez mais reclusos em seus locais de moradia, embora, nem isso resolva totalmente. Muitas casas têm sido arrombadas, invadidas e seus habitantes, além de terem seus pertences tomados, por vezes são espancados para fornecerem dados bancários.
Há 60 dias iniciei pesquisa entrevistando pessoas dos bairros da Lapa, Vila Romana, Vila Pompéia, Perdizes, Sumarezinho, Jardim Paulistano, Vila Madalena, Itaim Bibi e Moema. Os relatos são desalentadores! Para completar meu trabalho de pesquisa criminal, passei a percorrer, de carro, no final de tarde e à noite, esses bairros. Constatei o que tinha ouvido das pessoas que entrevistei. A redução de munícipes, por exemplo, passeando nas ruas com cachorros caiu drasticamente perante o medo de assaltos ou sequestros do pix. Tudo mudou. As compras no bairro não são mais feitas à pé, sendo que, aqueles que não compram pelo telefone acabam pegando o carro para ir a comércios que ofereçam estacionamento privativo e segurança, isso com distância de menos de 200 metros do local de moradia.
O prazer da andar pelas ruas da região acabou para muita gente. Se durante o dia a violência já vem imperando, imaginem no período noturno, o receio da abordagem por bandidos armados é ainda maior, tanto que, o hábito agradável de ir a restaurantes foi substituído pela encomenda de refeição delivery. Os bares com mesinhas na calçada também tiveram movimento diminuído pelo mesmo motivo, poucos clientes desses estabelecimentos ainda se arriscam a ter o celular, documentos e dinheiro surrupiados na busca de um prazer merecido, justo e que, embora prosaico, proporciona a descontração necessária após a labuta diária.
Muitos condomínios estão criando espaços internos reservados a mini mercadinhos, onde o morador faz suas compras sem precisar sair às ruas. O mercado imobiliário também sente alterações. Moradores de sobrados, preocupadíssimos com segurança, tendo em vista os relatos frequentes de vizinhos e pessoas conhecidas no bairro que tiveram os lares invadidos, estão se desfazendo de seus imóveis, até com perda financeira na venda, para mudarem para apartamentos. São direitos individuais, tradições e lembranças que se esvaem.
No dia anterior ao escrever este artigo, um de meus entrevistados teve a casa invadida no bairro do Sumarezinho/SP. Ele me enviou o seguinte relato: “Lordello, neste sábado tivemos nossa casa e carro furtados. Dei graças aos céus por não estarmos nela. Fui internado na 6a. feira às 22h para uma cirurgia eletiva no ombro. Como não poderia dirigir, foi ao hospital com minha esposa de Uber. A cirurgia correu bem e na volta, no domingo 10h30, encontramos o portão da frente violado e aberto, assim como a porta e janela da sala. Levaram a TV de 60″, relógios, jóias e o carro. Reviraram tudo à procura de valores. Até meus documentos pessoais foram subtraídos. Encontraram a chave reserva do carro e o controle remoto da garagem. Somente na minha rua, nos últimos seis meses, quatro casas foram invadidas e agora a vítima fui eu. O que fazer Lordello?”.
O que dizer para um casal de idosos que já não tinha mais coragem de passear a pé pelo bairro em que reside há décadas e que agora tem receio de ter o sobrado invadido pela segunda vez?
A triste conclusão é que cada vez mais veremos as ruas do bairro em que moramos vazias, escurecidas, com baixa movimentação de transeuntes, sem vida, sem o brilho do bate papo informal na calçada e com menos comércios pequenos.